Nalguns fins de tarde e inícios de noite, uma vela, acompanhada com chá, faz sempre de companhia.
Nessas alturas repara-se que ninguém ocupa a cadeira vazia, as únicas pessoas com que se fala apenas o fazem para perguntar se se quer pedir mais alguma coisa e as outras vozes que se escutam são de pessoas noutras mesas.
Os olhos vagueiam temporariamente pelas outras pessoas, à procura de alguém conhecido mas nada. Desistimos e sorve-se um pouco mais de chá, vira-se a página do livro que se está quase a apagar e em vez de o acabar olhamos para a única coisa com vida na mesa, a pequena luz que insiste em existir no centro da mesa, colocada dentro de um recipiente de vidro, tal como a rosa do pequeno príncipe, com o intuito de a proteger do resto mundo. Naqueles curtos momentos de contacto com essa pequena luz acredita-se que se seja sua guardiã e que ela existe por nossa vontade e desejo. E ela não se importa, até o deseja.
Bebe-se o último gole de chá, chama-se o empregado para pagar e deixamos a vela no sítio onde sempre ficou o tempo todo. Deseja-se levá-la discretamente para casa mas sabe-se da sua impossibilidade e que não duraria um minuto fora do seu círculo habitual. Foge-se sem deixar remorsos. A piedade não acrescenta nada à vida, apenas lhe tira vida.
Uma memória é congelada com a intenção de ser prolongada num outro dia, sensivelmente há mesma hora, com uma vela a fazer de companhia - ingenuamente acredita-se ser a mesma do outro dia, quer-se acreditar que assim seja. A vida não tem significado de outra forma.
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